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RECORD – Algum dia acreditou que seria “Sporting forever”?
PAULO BENTO – Não. Entendi o contexto em que foi dita a frase. O presidente deu-me um sinal de confiança, reflexo da crença num trabalho que ele conhecia e que pretendia continuar em condições muito idênticas em termos financeiros mas simultaneamente com outras condicionantes. Nesse aspeto, tive o cuidado de avisar o que poderia vir aí. Não entendi a expressão como uma manifestação eleitoral, mas sei que no futebol as coisas podem diluir-se de um dia para o outro, pois há outros fatores, que não têm só a ver com a confiança, que não se conseguem controlar.
R – Franco disse que gostaria que fosse o Ferguson do Sporting. Bettencourt colocou-lhe o rótulo “forever”. Nesta relação de “amor” houve alguma traição?
PB – Não, não. O que houve foi uma ponderação sobre determinados fatores que estavam a acontecer no Sporting, nomeadamente as exibições e os resultados dos últimos 4 meses, e depois, num período de 3 ou 4 dias, uma decisão que me levou à demissão. Nunca houve um ato de traição. Sempre tive confiança e solidariedade de quem trabalhou comigo.
R – De toda a gente?
PB – Da administração, da direção do futebol e dos jogadores, sim. Apesar disso, embora considerasse que eu não era o único problema e nem sequer o principal problema, tinha porém uma certeza: já não era a solução. Por isso, e para libertar os jogadores para que eles expressassem melhor as suas qualidades, para libertar a administração e a direção para fazerem outras coisas, achei que era minha obrigação colocar o lugar à disposição. Para que ninguém ficasse condicionado, só comentei essa decisão junto de um grupo restrito de nove pessoas.
R – Colocou o lugar à disposição ou demitiu-se?
PB – Disse que me queria ir embora. Não dei hipótese de escolha. Fiz o meu diagnóstico a nível desportivo – quantidade e qualidade de resultados -, de tudo aquilo que se vivia à volta da equipa – que já estava a passar para os jogadores – e tracei um contexto que previa pudesse acontecer. Confesso que no início não imaginava que as coisas corressem tão mal. E neste aspeto falo de ganhar poucas vezes e não de perder muitas vezes.
R – Qual foi o fator decisivo que o levou a pensar que já não dava mais?
PB – O jogo com o Marítimo.
R – A bola ao poste…
PB – Não só por isso. Se quisermos ser redutores, diria que, por dois minutos, os minutos finais de Guimarães e o do Marítimo, não estaríamos aqui.
R – Acha mesmo que não estaríamos?
PB – Não sei. Os resultados podem mudar alguma coisa, calar muita gente e não condicionar outra – os jogadores. Mas se calhar era apenas adiar o inevitável. Analisei e refleti sobre tudo o que se passou e aquilo que o jogo com o Marítimo trouxe foi a definitiva convicção de que estava na altura de dar o lugar a outro.
R – É nessa noite que decide sair?
PB – No dia a seguir, depois de falar com a família e com a equipa técnica e de desabafar com o Rui [Jorge]. Todos me ouviram, mas nenhum deles me tentou demover. A decisão ficou nas minhas mãos e resolvi transmiti-la à administração, independentemente do resultado com o Ventspils. Achei que era o momento oportuno, pois vinha novo jogo e, portanto, era necessário libertar os jogadores.
R – Nesses dias ninguém desconfiou?
PB – Não, embora depois do jogo com o Marítimo, atendendo ao meu estado de espírito, talvez tivessem imaginado que eu poderia estar a pensar na saída. Espero que tenha sido uma decisão que ajude o Sporting a chegar aos seus objetivos.
R – Soares Franco disse que não seguiria o rumo atual. Acha que com ele a presidente ainda era o treinador?
PB – Não. Tomaria esta decisão fosse quem fosse o presidente. Perante este trajeto, com os mesmos resultados e exibições, seguramente tomaria a mesma decisão. Com Soares Franco também tive uma excelente relação, ao ponto de ter dito que ele seria sempre o “meu presidente” – o que não significa que não tenha por outros, como é o caso de José Eduardo Bettencourt, o mesmo respeito e admiração. A única maneira de não tomar esta decisão era se tivesse do outro lado alguém que estivesse a fazer algo prejudicial ao grupo de trabalho, equipa técnica ou a mim próprio. Tendo em conta que quem trabalhava comigo era solidário e sério e que depois havia um plantel que merecia da minha parte a máxima consideração, o mínimo que poderia fazer era pôr em cima da mesa a minha demissão.
R – Disse várias vezes que se sentia defendido pela SAD, mas sentiu a mesma solidariedade do clube?
PB – O Sporting tem um problema. Vive em dois polos. Cheguei ao clube com uma idade e maturidade que já me permitia olhar para o futebol de uma maneira que não era só para o jogo. Em pouco tempo, foi fácil perceber essa diferença: o que era a administração – e a intenção que tinha de blindar um grupo de trabalho – e o que era o clube – onde muita gente procura protagonismo, falando sistematicamente de fora para dentro, sendo muitos deles, se calhar, responsáveis pela situação que o Sporting atravessa. São pessoas que estiveram cá em devido tempo sem conquistar algo que tivesse sido relevante. O que me preocupava, porém, era que a SAD tivesse confiança naquilo que eu fazia de forma competente, séria e solidária e sempre num quadro de exigência mútuo. Concluindo: esses doutores que gostam de estar de forma permanente na comunicação social, alguns deles com responsabilidades no clube, não tiveram comportamentos próprios de acordo com certos valores e não foram solidários, especialmente nestes quatro meses.
R – Essa é uma cultura sulista. O Benfica também discutiu na praça pública a sua vida interna e só os resultados calaram muita gente. São características que dificilmente desaparecem…
PB – Eu acho que podem e devem desaparecer. O Benfica, nos últimos dez anos, não ganhou mais do que o Sporting mas seguiu o seu caminho. O Sporting, mesmo a ganhar, tem dificuldades em seguir o seu caminho. E isso só se faz sem medo…
R – É uma questão de liderança?
PB [sem se interromper] – … isso só se faz com coragem. Se alguém falar, não se pode falar mais alto, mas sim denunciar os arautos da verdade que nunca fizeram nada em prol do Sporting. Na sexta-feira, 6 de Novembro, e no dia seguinte, o presidente deu o primeiro passo nessa direção.
R – Acha que não deu o segundo?
PB – Vejo o presidente do Sporting como uma pessoa corajosa, tenho-o como uma pessoa séria, credível e demonstrou-me uma solidariedade enorme. Espero que, apesar da emotividade daqueles dois dias, ele não perca a coragem que revelou. Sei que ser presidente do Sporting era um sonho para Bettencourt, mas tenho a certeza de que nunca o será a qualquer preço. Se não fizer marcha-atrás naquilo que disse a 6 e 7 de novembro, se calhar mesmo passando por dificuldades – porque vai passar! -, conseguirá colocar o Sporting no rumo certo, tornando-o mais sólido, solidário e com mais condições para conseguir melhores resultados. Se se rodear de pessoas para controlar outras franjas, mais tarde ou mais cedo acabará por cair como caíram tantos outros.
R – Acha que está a correr esse risco?
PB – Do meu ponto de vista, deu um passo importante nos dias 6 e 7, espero que tenha a coragem para continuar a seguir esse caminho. Faça o que fizer, quem lhe quer mal não vai desistir de tentar fazê-lo. Por isso, que dê esses passos! Ele seguramente terá mais coisas para fazer do que ser presidente do Sporting. Eu saí, mas nunca deixei de dar os passos que queria dar. Nunca fiz nada que fosse contra a minha vontade e os meus princípios. Nunca pedi para escreverem o que quer que fosse, nem para tirar o que quer que fosse. O que fiz, foi sempre com plena consciência de que o estava a fazer em prol do Sporting.
«Rogério Alves não teve comportamentos éticos»
R – Usou a imagem do “Titanic” e de alguém que saltava para o bote salva-vidas. A quem se referia?
PB – Foi antes do jogo em Florença, quando se fizeram passar mensagens com o intuito de denegrir e criticar o trabalho do diretor do futebol. Neste contexto algumas pessoas, nomeadamente o presidente da AG, o dr. Rogério Alves, teve intervenções em que misturava a amizade com o trabalho. Nessa altura, tive o cuidado de dizer que quem estivesse dentro [do "Titanic"] não se pusesse fora. Essa mesma pessoa, que é uma figura do clube pelo cargo que ocupa e não tanto por aquilo que tenha feito na história do Sporting, pelo menos que eu conheça, teve ao longo destes 4 meses alguns comportamentos que não foram, na minha opinião, nem corretos nem éticos. Concretamente algumas declarações nesta fase final do meu trajeto. Mas eu sei o que me foi dito pessoalmente no passado e o que foi dito atualmente por outra via. Com a responsabilidade que tem, no clube e socialmente, o que disse sobre a tentativa de invasão das instalações do Sporting não me parece minimamente solidário nem correto. A nobreza que ele diz que eu tive na minha saída não foi a mesma que manifestou nestes últimos tempos.
«Quiseram atingir três pessoas e afetaram todo o grupo»
R – O que aconteceu era expectável, atendendo ao fraco investimento e aposta dos rivais. Como achou possível lutar de igual para igual?
PB – O que me fez ficar no Sporting teve a ver com a entrada de José Eduardo Bettencourt para presidente e a continuidade de uma estrutura que ele pretendia manter. Tendo em conta alguma estabilidade do trabalho desenvolvido, até porque em três dos quatro anos estivemos perto de atingir o maior objetivo – mesmo no ano em que apanhámos a equipa mais ou menos na altura em que o novo treinador agora a encontra. Por isso, acreditámos que era possível estar na luta, mesmo sabendo que o FC Porto continuava com grande cultura de vitória e estável em termos de equipa técnica, voltando a investir forte, enquanto o Benfica, tendo ficado sempre atrás do Sporting nas 4 épocas anteriores, tinha repetido um enorme investimento.
R – Acreditava que a estabilidade poderia dar coisas boas e que o Benfica poderia passar mais um ano sem acertar nas escolhas?
PB – Acreditávamos, acima de tudo, no nosso trabalho e que poderíamos combater duas equipas que, cada uma à sua maneira, tinha melhores condições. Mas agregado a isso, outras condicionantes a nível desportivo e um determinado ambiente que se criou desde a primeira hora acabaram por afetar essa estabilidade.
R – O ambiente em redor da equipa foi manipulado ou teve causas naturais?
PB – Houve um ambiente mais legítimo que sei distinguir. O direito de as pessoas, durante ou no final de um jogo, manifestarem a insatisfação pela produção da equipa e pelo resultado, é normal. Isso só surgiu após o Belenenses. Agora, o anterior não é normal. Disse-o numa conferência de imprensa: não sabia quem eram os atores mas sabia qual o cenário que estava montado.
R – Que era…?
PB – Um cenário que pretendeu desde cedo atingir certas pessoas, pensando talvez que não atingiria o mais importante, os jogadores. O problema é que atingiu toda a gente e numa fase precoce da época.
R – Mas não devem estar todos preparados para a pressão?
PB – Todos devemos estar preparados para a pressão e insatisfação. Agora, é muito mais difícil para um grupo que não tem grande maturidade, combater determinadas situações. Não é normal a receção que tivemos após passarmos uma eliminatória (Twente). E não interessa que tenham sido duas ou três pessoas, uma vez que quem o fez pensou bem no que queria fazer, foi concertado, não foi espontâneo. Não é normal que após a 1.ª jornada do campeonato, empatando fora de casa, se tenha repetido.
R – O objetivo dessa ação concertada era a cabeça de Paulo Bento?
PB – Não, à partida não seria a cabeça do Paulo Bento. Mas o episódio repetiu-se após o jogo de Florença. Creio que o cenário foi montado e orientado em primeiro lugar para as três pessoas que saíram agora. E fizeram-no de duas maneiras: uma, atingindo o Pedro Barbosa, para ver se chegavam ao treinador; e outra pelo treinador, para ver se atingia as outras duas pessoas. Isso parece-me evidente. A mim, faltou-me capacidade para tirar os jogadores deste ambiente e turbulência e colocá-los a jogar de maneira diferente. Mas, como é óbvio, houve questões exclusivamente desportivas que tiveram como consequência maus resultados e falta de qualidade do futebol praticado.
R – A estratégia, então, resultou!
PB – Não sei. Eu saí pelos resultados e por a equipa não ter capacidade para jogar melhor. A minha saída e a entrada de outras pessoas leva a que o ambiente se acalme, pois se calhar tem a consequência de tranquilizar outras franjas do clube. Essa obrigação eu não a tinha. O que tinha de fazer era treinar e defender os interesses do Sporting, e isso acho que fiz de uma forma competente. Preocupo-me pouco com o parecer. Gosto mais de ser do que parecer. Se quisesse sair pelo ambiente que estava criado, poderia ter saído quando viemos da Madeira (Nacional) em 2007/08, quando invadiram a garagem na oitava jornada de 2008/09 após o jogo com o Leixões, quando parei à porta da Academia depois do encontro com o Bayern – e tudo isto com a minha família por perto a assistir. Por isso, não era por 200 ou 300 indivíduos quererem invadir Alvalade que iria pedir para sair. Passei por outros episódios enquanto jogador e nunca o fiz. Mas digo: se um dia o Sporting, pela falta de militância que dizem, apenas tiver 6.600 adeptos no estádio e os 6.000 conseguirem calar os 600, o Sporting será melhor clube. Eu respeito todos. Mas respeito muito mais os 6.000 que pagam a gamebox e têm direito a algumas coisas do que os 600 que ainda recebem algo em troca e têm o dever de apoiar.
«Se o Benfica tivesse sido campeão não teria estado 4 anos no Sporting»
R – Teve inveja dos plantéis de Benfica e FC Porto?
PB – Não senti inveja mas também não tremi, pois estava focalizado em rentabilizar os jogadores que tinha. Sabia, e disse-o, que a nossa luta era muito desigual e que teríamos de ter outros argumentos. Mas à luta desigual juntou-se uma depressão enorme nos sportinguistas pela pré-temporada do Benfica, agregada à nossa. Isso levou a que se criasse um clima de maior pressão, de intolerância, sem que se valorizasse o que se fez até aqui. Se os sportinguistas pensarem bem, e reportando-nos a esta década, têm poucas razões para ter inveja do Benfica. Nunca houve ninguém do Sporting que dissesse que o objetivo era ficar à frente do Benfica. Nunca! O que nós dissemos foi que, na eventualidade de não ficarmos em primeiro, é melhor ser segundo do que terceiro. Sempre quisemos ser campeões. Para nós era indiferente, não o sendo, quem era o campeão e quem ficava em 3.º. Mas tenho a clara noção de que se o campeão tivesse sido o Benfica e não o FC Porto, se calhar não tinha estado 4 anos e 4 meses em Alvalade. Provavelmente nem Soares Franco me tinha aguentado…
«O que se passou na Taça da Liga foi aberrante»
R – A péssima relação que manteve com a arbitragem não foi prejudicial?
PB – Não mantive nem boa nem má relação com os árbitros. Pura e simplesmente não me relacionei com eles. Acho que os árbitros devem relacionar-se entre eles e com mais ninguém. Um dos grandes problemas, aliás, é quando eles se relacionam com mais gente. O que fiz, reconhecendo algum excesso num ou noutro momento, essencialmente através de certos gestos, foi defender os interesses de quem comandava e de quem representava. Até hoje ainda não vi ninguém, além de criticar os excessos que tive nalgumas alturas, dizer que eu não tinha razão. A verdade é esta: um golo com a mão à 3.ª ou à 30.ª jornada produz exatamente os mesmos efeitos. Depois, porque não foi só esse caso. Além disso, registaram-se diferenças de critério que assinalei ao mesmo árbitro. Mal seria se perante tantas situações não nos revoltássemos.
R – Mas acha que prejudicou ou não?
PB – Seria um mau princípio, pois toda a gente fala de arbitragem. Uns antes, outros depois dos jogos, uns de uma maneira e outros de outra, mas toda a gente fala dos árbitros. Eu escolhi uma forma clara. Tem a ver com a minha personalidade.
R – Insisto: prejudicou ou não?
PB – Se prejudiquei por dizer a verdade e argumentar com a verdade, então isso tem a ver com o corporativismo da classe. Se o facto de se falar de arbitragem leva a que haja uma atitude persecutória, isso é grave e deveria ser objeto de análise de outras instâncias.
R – Acha que vai aliviar-se essa tensão sobre o Sporting?
PB – Não faço ideia. Se isso acontecer, é sinal que o alvo da perseguição era eu e revela o caráter e a personalidade dos árbitros.
R – Quando disse que os árbitros eram muito bem tratados em Alvalade, foi interpretado como um apelo à violência. Temeu essas consequências?
PB – Enquanto jogador tive seguramente atitudes menos corretas e como treinador cometi alguns excessos. Essa situação resultou de sentirmos noutros estádios um ambiente mais pressionante, mas nada a ver com violência. Como havia um cidadão que na altura era presidente da APAF mas que não era muito conhecido, resolveu criticar o treinador do Sporting para se fazer conhecido. Hoje já ninguém se lembra dele. Nunca instiguei à violência.
R – Alguns árbitros com quem se travou de razões terão algum peso na consciência? Houve algum jogo que achou que era um caso de polícia?
PB – Tenho 20 anos de futebol e joguei durante 15. Sei bem como alguns árbitros apitam e as decisões que tomam no meio de determinados ambientes. Por exemplo, aquilo que se passou na final da Taça da Liga é aberrante. A única pessoa que sabe que não foi penálti, até hoje não foi ouvida e nunca disse o que se passou no Estádio do Algarve. O árbitro estava cheio de dúvidas sobre a decisão que tomou e o único que lhe deu indicações foi um fiscal de linha que estava a 50 metros e não aquele que se encontrava melhor posicionado. Vi certas decisões noutras ocasiões no mínimo esquisitas. Recordo, por exemplo, o jogo com a Naval na Figueira da Foz em que é mostrado um amarelo ao Patrício aos 30 minutos por queimar tempo e o Derlei é expulso depois de ter sigo agredido. Não conseguirei provar se fez de propósito, mas nunca me obrigarão a acreditar nesses critérios.
R – Falou com Lucílio Batista a esse respeito?
PB – Nunca falei.
R – Nem com um dos outros que lá estavam?
PB – Não.
R – Mas gostava que alguém tivesse dado uma explicação?
PB – Era preferível ele não ter ido à SIC no dia seguinte fazer a figura que fez.
R – Quando um árbitro comete um erro grave, o que deve acontecer?
PB – Se os jogadores e os treinadores são castigados, eles também devem ser.
R – …
PB – O que se passou depois do penálti na final da Taça de Liga é esclarecedor. O poder que os árbitros têm de controlar um jogo com falta aqui e ali sempre longe da baliza é sintomático. E se não há a coragem de denunciar esse poder, as pessoas andarão sempre enganadas. E é preciso fazê-lo para dar credibilidade ao futebol.
R – O Sporting não foi beneficiado?
PB – Foi, em Vila do Conde com o golo off-side do Vukcevic e outro do Yannick em 2008/09, mas não tenho dúvidas que o Sporting foi muito mais prejudicado do que beneficiado.
R – Vê vantagens nos seis árbitros?
PB – Acho que é pior ter mais gente a decidir. Em todo o caso, talvez pudesse ter hoje no meu currículo mais uma Taça da Liga. Pelo menos, não tinha ficado nas mãos de um Ferrari…
R – Sentiu menor apoio do clube nesse combate?
PB – Nunca me senti sozinho em nenhuma situação. Tive de forma incondicional a solidariedade, apoio e confiança que necessitava. Mas é preciso aceitar e entender a personalidade e o caráter de cada um. Por exemplo, em relação à nomeação do árbitro [Duarte Gomes] para o FC Porto-Sporting, disse-o antes e depois, publicamente, não concordar que o Sporting fosse para o Dragão sem marcar uma posição face àquilo que foi uma verdadeira afronta. Acho que foi um erro de todos nós, inclusivamente meu.
R – Acatou uma ordem?
PB – Era a nossa estratégia, com a qual de facto eu não concordava, mas que respeitei. Só que quando somos afrontados devemos dar voz à nossa revolta.
R – Disse muitas vezes que se sentia protegido, mas não devia ter sido mais prudente no assumir de algumas dores e de confrontos?
PB – Isso faz parte de uma forma de estar e de liderar. Sempre achei que deveria ser o treinador o primeiro a defender o grupo. Nunca me senti desconfortável, pois tive a felicidade de dispor de uma estrutura que me acompanhou, desde os tempos do Carlos [Freitas], com o dr. Ribeiro Teles e o Pedro [Barbosa].
«Já não éramos capazes de meter medo»
R – Algum jogador do Sporting se escondeu durante a crise?
PB – Não. Acho que temos muito a tendência, especialmente quando as coisas correm mal, de acusar os jogadores de falta de empenho, atitude e caráter. No Sporting não houve nada disso. Com exceção à primeira parte do jogo em Guimarães não senti, nunca, que houvesse falta de atitude. Se houvesse não se tinha conseguido empatar no último minuto na Holanda, virar o jogo com a Fiorentina, virar o jogo com o Olhanense ou marcar ao minuto 80 com o Paços de Ferreira. Às vezes acho que temos vergonha. E então vamos pelo mais simples, os jogadores não querem. É melhor termos coragem para dizer: nós queríamos mas não podíamos. E a verdade é que nós já queríamos muito mas podíamos pouco. Para não perder, e nós perdemos poucas vezes – em 18 jogos só perdemos dois e com algumas condicionantes pelo meio nos dois jogos [n.d.r.: Sp. Braga e FC Porto] -, o querer é muito importante. Porque basta correr, ter atitude e organização, mas é mais fácil porque não se tem a bola. O poder implica ter risco, personalidade para saber ter a bola, implica – num contexto difícil como o nosso – maior capacidade de decisão, e isso já não tínhamos. A pressão, por todos os motivos que já falámos, estava a passar para eles. E quando assim é, o mais fácil é dizer que eles não querem ou não correm. É mentira! Os jogadores do Sporting tinham, e isso criámos ao longo de 4 anos, uma identidade de treino. Intensidade, agressividade, uma cultura de treino. A verdade é que já não estávamos a conseguir passar isso para o jogo. Porque não podíamos. Falhávamos mais passes, não assumíamos riscos, porque se calhar já não tínhamos naquela altura quem os assumisse. Já não discutíamos tanto como discutimos noutras alturas, já não conseguíamos meter medo aos adversários.
R – Jogadores que foram sempre fiáveis ao longo dos últimos anos esta época falharam. Caso de Polga, mas também Moutinho e até Liedson. Como se explica?
PB – Nesses jogadores não é a qualidade deles que está em causa, mas sim o rendimento.
R – Mas não conseguiram puxar a equipa para cima…
PB – Não conseguiram porque o rendimento em termos globais era demasiado fraco. O Sporting teve nesta altura três jogadores com muita estabilidade em termos de rendimento: Rui Patrício, Daniel Carriço e Miguel Veloso. Nestes 4 meses foram os jogadores que se exibiram melhor, ainda que não estejamos a falar de jogadores com grande maturidade e todos com perfis bastante diferentes. Depois tivemos Liedson, que resolveu em alguns momentos, mas não conseguiu ter um rendimento tão uniforme como noutras alturas.
R – Mas como é que explica o claudicar da espinha dorsal?
PB – O querer muitas vezes atrapalha. A pressão a que equipa esteve sujeita e o facto de querer muito fez com que não conseguisse fazer as coisas da melhor maneira. E a verdade é que Polga por um motivo, Liedson e Moutinho por outros motivos, ou seja, porque os jogadores nem sempre estão bem, foram elementos que em função do pouco rendimento coletivo que havia, não conseguiram resolver todos os problemas da equipa. E não era exigível que assim fosse.
R – Polga foi o de pior rendimento…
PB – Polga passou por uma situação diferente. Após os primeiros treinos, começou com algumas limitações. Eu disse-o, mas em função do caráter dele, do sacrifício, da capacidade mental, aguentou jogar com algumas limitações. Ele fazia-nos muita falta. Até que chegámos ao ponto, após o jogo com o FC Porto, por não haver condições, quer em termos físicos, quer em termos emocionais, em que tentámos recuperá-lo. Não teve o rendimento de outras temporadas, mas não teve um rendimento tão negativo como quiseram fazer crer. A nossa falta de consistência defensiva passa por muitos outros fatores. Por exemplo, a forma como atacávamos. Os desequilíbrios que criávamos a nós próprios.
«Merecíamos o título em 06/07»
R – O que lhe faltou, melhores jogadores?
PB – Não digo que não tivesse faltado investimento, mas sabia disso. Nalguns momentos, especialmente em 08/09, faltou-nos capacidade para sermos campeões, sobretudo na passagem da 1.ª para a 2.ª volta. Em 06/07 merecíamos mais: jogámos bem, fomos consistentes, tínhamos níveis de intensidade muito altos. Em 05/06 perdemos o campeonato em Alvalade com o FC Porto, que era de facto uma grande equipa. Em 06/07 e 08/09 sobrou-nos a incompetência das equipas de arbitragem. Em 06/07 sofremos duas derrotas: uma com o Benfica e outra com um golo com a mão. Era o ano de sermos campeões. O Sporting foi melhor.
R – E este ano?
PB – A estabilidade é importante, mas havia que manter todos mudando um, ou mantendo um teríamos de mudar mais. Ou seja, era necessário dotar a equipa de maior competitividade e qualidade.
«Equipas de Carvalhal têm identidade»
R – Carlos Carvalhal é boa solução para o Sporting?
PB – Não tenho de achar ou deixar de achar se é a melhor solução. O que posso dizer é que é um treinador que já tem experiência de primeira divisão, que já ganhou uma competição com o V. Setúbal e à custa do Sporting, foi finalista da Taça de Portugal, disputou a Supertaça e fez um trabalho extraordinário em Setúbal e em Matosinhos com o Leixões. É um treinador em que se vê que as suas equipas têm identidade, que tem agora a oportunidade num clube grande, e que me parece uma oportunidade justa. Não é alguém com quem tenha grande contacto, mas a quem reconheço competência e em quem vejo condições para treinar o Sporting. Aliás, aproveito para dizer que lhe desejo desde já a maior sorte do Mundo.
R – Ele já falou consigo, ou está disponível para falar com ele?
PB – Sim, já falei com ele. Houve um pedido e mostrei toda a disponibilidade para trocarmos impressões sobre o Sporting.
«Depende do que fizerem em janeiro»
R – Quem é que vai ser campeão?
PB – Há três equipas melhor posicionadas do que o Sporting, que tem um fosso grande em termos pontuais. Já estivemos noutras situações assim. Já virámos a primeira volta a 10 pontos de distância em 05/06 e à 6.ª jornada de 06/07 fomos ao Dragão com 9 pontos de atraso. Ou seja, tudo é possível. É muito difícil mas não é situação virgem no Sporting. Depois há três equipas: o Benfica e o Braga, que estão em primeiro, e o FC Porto, que está a 5 pontos e depende apenas de si em relação ao Benfica. O Braga está a correr por fora, ainda não se assume, mas todos têm uma palavra a dizer. Até o Sporting. Depende do que quiserem fazer e do que reformularem em janeiro. O Sporting vai continuar a lutar.
R – Acredita no Braga?
PB – Acho que têm uma grande vantagem, se lhe podemos chamar assim, que é terem sido eliminados da Liga Europa. Até porque tem menos impacto do que num dos grandes e dá-lhes outro espaço para encarar a Liga. Mas depois há o orçamento. Está na moda dizer que o orçamento não tem influência, mas tem muita. Basta olhar para os outros campeonatos. O Sevilha e o Valencia não são tantas vezes campeões como o Real Madrid e o Barcelona. Ou Sampdoria, Roma e Fiorentina não são tantas vezes campeãs como são o Inter ou o Milan. E a verdade é que agora se fala muito do Braga em comparação com o Sporting. Mas o Braga nunca ficou nestes 4 anos à frente do Sporting. Nem se sabe se vai ficar ou se ficaria. Mas nunca ficou. Por isso os orçamentos de Braga e Sporting tiveram influência nos últimos anos. A época passada, até com um orçamento maior, o Braga ficou atrás do Nacional, que tinha um orçamento menor. Quando se fala em orçamentos, fala-se para uma época. Não é por uma equipa perder um jogo, porque isso parece-me redutor ou até sinónimo de alguma falta de inteligência da parte de alguns doutores. Uma das coisas que diz a história do Sporting, principalmente nos últimos 10 anos, quando o clube voltou a ganhar, é que quando investiu em dezembro de 1999 ou em junho de 2001, foi quando foi campeão. Não antes nem depois.
«Nunca sairei pela porta pequena»
R – Estes 4 meses a mais em Alvalade penalizam a sua carreira?
PB – Não, claramente não. Tenho uma carreira curta como treinador, que tem momentos muito positivos e um muito negativo – a eliminatória com o Bayern. Mesmo não sendo campeão nacional, a minha carreira não vai ser afetada por estes quatro meses. E quem vem agora vai encontrar o Sporting numa situação muito parecida com a que encontrei, embora o fosso pontual para o líder neste momento seja maior, mas esteja na Europa. Quando eu cheguei, o Sporting não ganhava desde 2001 e depois disso conquistou taças e supertaças, que apesar de tanta confusão que fazem a algumas figuras do Sporting, deram prestígio ao clube.
R – A maior mágoa que fica ao sair do Sporting.
PB – Houve uma humilhação: a eliminatória com o Bayern. E não ter conquistado o título.
R – Saiu pela porta pequena?
PB – Não. Isso não existe. Nós saímos pela porta que queremos e isso não tem a ver com resultados mas sim com os valores e princípios que defendemos. Além disso, acho que fui competente no Sporting, mas tal não significa que não tenha cometido erros. Nunca sairei pela porta pequena de qualquer clube porque não vou mudar. Serei sempre como sou.
«Sabia que Sá Pinto voltaria no dia em que eu saísse»
R – Foi o treinador que dispensou Sá Pinto quando ele desejava continuar a jogar no Sporting. Tinha a certeza que no dia em que saísse ele estaria de volta?
PB – Acho que era uma coisa mais ou menos certa. Em relação à questão da dispensa, é preciso esclarecer que não fui eu que andei durante o ano todo a dizer que ia terminar a carreira. Depois eu tinha que tomar uma decisão. E a que tomei foi de não continuar a contar com ele como jogador. Agora este regresso não me surpreende. Era uma questão de tempo. Logicamente enquanto estivessem estas pessoas na estrutura do futebol, ou pelo menos enquanto eu estivesse na estrutura do futebol, não trabalharia comigo. Agora, saindo esta estrutura parecia-me claramente que era ele quem ia entrar.
R – Mas Sá Pinto não trabalharia no futebol por sua vontade…
PB – Por minha vontade. Acredito que pela dele também, mas por minha vontade seguramente.
R – Tem a ver com esse ano?
PB – Tem a ver com questões de confiança. Gosto de trabalhar com certas e determinadas pessoas e não me via de forma alguma a trabalhar com o Sá Pinto. E acho que ele não se via a trabalhar comigo.
R – E a entrada dele para diretor de futebol?
PB – Acho que era uma questão de tempo. Para mim não foi uma surpresa e tendo em conta o que se passa no Sporting, acho-a perfeitamente natural. Quando terminasse esta estrutura que saiu, ele estaria dentro. Aliás, ele já trabalhava lá dentro. Penso que sendo uma pessoa que estava nas relações externas, de certa forma já trabalhava internamente. Até porque entendo que agora o Carlos Carvalhal foi uma decisão mais do presidente, enquanto a primeira opção me parecia mais de quem entrou, neste caso do Sá Pinto, do que propriamente de José Eduardo Bettencourt. E quando digo que era uma questão de tempo, digo-o porque as coisas estavam de alguma forma já a ser preparadas para que assim fosse. Se influiu alguma coisa no meu trabalho, sinceramente não. Mas que me parecia que isso ia acontecer mais cedo ou mais tarde, porque isso estava dependente da queda desta estrutura, parece-me uma situação perfeitamente normal para o universo sportinguista, não todo, mas para uma certa parte do universo sportinguista.
R – Está a dizer que internamente havia pessoas que estavam à espera que as coisas corressem mal para ter a sua oportunidade?
PB – Não sei se estavam à espera que as coisas corressem mal. Eu acho é que o cenário que foi criado, essas pessoas que criaram o tal cenário de que falei no início da entrevista, seguramente não estavam à espera de que as coisas corressem bem. Disso tenho a certeza absoluta. Basta ouvir algumas declarações, por exemplo há bem pouco tempo as do próprio Sá, quando confrontado com a situação do treinador e uma das respostas foi: ainda não estou nesse cargo. Ou seja, se diz ainda não estou, seguramente, é porque sabia que lá chegaria. Não é uma situação que possa causar grande surpresa, ou se preferir, a mim não me causou surpresa nenhuma.
«Paciência para Caicedo e Angulo Matías vale o investimento»
R – Porque é que Varela e Viana não serviam para o Sporting?
PB – Quando eu cheguei ao Sporting o Varela estava no plantel. Colocámo-lo a rodar. Depois, dentro da forma que jogávamos, Varela sentia-se muito melhor como extremo do que como ponta-de-lança. Por isso fomos à procura de outras opções. Não está em causa a capacidade nem o valor do jogador. Simplesmente na altura não era um jogador que se enquadrasse na forma de jogar do Sporting.
R – E Hugo Viana?
PB – Falo apenas deste ano. As coisas aconteceram já depois da época estar a decorrer e quando soubemos que Izmailov não ia poder jogar. Aí Viana não era um jogador com características para poder fazer a mesma função. Podem perguntar se Angulo era. Era porque podia fazer os vértices laterais do losango.
R – Reforços foram um fracasso?
PB – Não. Angulo e Caicedo vivem as dificuldades inerentes a um período de adaptação. Mas não estão, de facto, a render o que esperávamos.
R – Estão já queimados?
PB – É verdade que às vezes o ambiente pode queimar jogadores e alguns até com futuro promissor. É preciso ter alguma tolerância para os que chegaram num determinado contexto que não lhes foi favorável. O Caicedo está a pagar por ter perdido três oportunidades de golo (Belenenses, Marítimo e Rio Ave), mas tem potencial.
R – E Angulo?
PB – Não está a ter rendimento positivo, pois em dois jogos as coisas não saíram nada bem (Paços e Olhanense).
R – Matías Fernández é o único sucesso…
PB – Foi o único em que o Sporting investiu dinheiro. Tem uma capacidade técnica extraordinária, agregado a uma enorme capacidade de trabalho no jogo e no treino, grande humildade e vontade de aprender. Sendo o único, o foco ficou todo sobre ele. Isso cria também, dentro do atual contexto, uma pressão acrescida a um jogador que tem 23 anos.
«Dificilmente voltarei um dia ao Sporting»
R – Onde estaria se não tivesse ficado no Sporting?
PB – Durante a temporada passada apareceram-me algumas possibilidades que poderia ter equacionado e transmitido, e nem sequer o fiz. Para mim estava claro o objetivo de terminar a temporada no Sporting. Se tivesse decidido mais cedo, e não estou arrependido, se calhar poderiam ter existido outras situações. Ao certo onde estaria não consigo dizer, e mesmo que o conseguisse, não o faria por uma questão de respeito ao Sporting.
R – Portugal ou estrangeiro?
PB – Quero treinar. Não de imediato, e quando digo isso é também porque não tenho essa perspetiva, pois nunca se sabe o que pode acontecer. Quero descansar. Foram 20 anos sem parar. Não sei se o vou conseguir. Mas quero ter tempo para a família, a quem dediquei pouco nestes anos, e agora como treinador ainda menos. Quero voltar a treinar no início da próxima época.
R – Para quem esteve 4 anos no Sporting há projetos menores?
PB – Não. Tive o cuidado de dizer isso em 07/08, a seguir à final da Taça da Liga que perdemos com o V. Setúbal. Não tenho qualquer ideia preconcebida que a seguir a sair do Sporting tenho de treinar outro grande, ir para a Seleção ou então para o estrangeiro. Não. Há outros projetos que são aliciantes, há clubes que oferecem boas condições para se fazerem bons trabalhos, tendo outros objetivos. Por isso não vivo minimamente obcecado com essa ideia de ter de sair para um patamar igual ou superior. Aquilo que aceitar tem de ser um projeto que eu acredite que é válido, com pernas para andar, credível, com gente séria, e que terá da minha parte tudo isso também.
R – E regressar ao Sporting?
PB – Acho que os regressos são sempre piores. Se me perguntar se digo rotundamente não, não digo, mas dificilmente voltarei ao Sporting. Foram 9 anos e meio, numa década em que se ganhou muito. Eu só não estive envolvido no título que quebrou o jejum, depois estive envolvido, com um muito pequeno contributo, em todos os outros, e tive um gosto enorme em representar o Sporting.
R – Tem algum compromisso para não representar de imediato outro grande?
PB – Não. Saí do Sporting com a mesma liberdade e independência com que entrei. Apresentei a minha demissão e a partir daí sou livre.
«Simon Vukcevic cresceu pouco em termos táticos»
R – Fala-se muito de Caicedo, Angulo, Polga, mas há um jogador que poderia ter dado muito mais e que em Alvalade escapa às críticas. Não devia Vukcevic também ter rendido muito mais?
PB – Vukcevic tem uma característica extraordinária: espontaneidade em zonas de finalização. É um jogador que tem cheiro pelo golo. Agora é também um jogador que gerou um esforço tremendo da equipa técnica para o fazer crescer, quer em ações coletivas, quer em ações individuais. Um jogador que tentámos integrar o mais possível dentro da manobra da equipa, pois vinha com um estilo de jogo e conceito de equipa completamente diferente. Aliás, isso tinha-lhe causado alguns problemas na equipa anterior, o Saturn. Ou seja, à parte de outros problemas que vivemos com ele durante este trajeto, é um jogador que em termos táticos cresceu pouco. E isso porque em muitos momentos não quis crescer mais. Pensava que a qualidade individual lhe chegava. Agora há jogadores que são mais difíceis, não só pela sua irreverência, como também pelo gosto que não têm de aprender. Para aprender é mais fácil gostar-se de futebol e uma das coisas que ele disse numa entrevista é que não gostava de ver futebol… Mas é, de facto, um jogador que tem um ambiente extraordinário em Alvalade, que tem realmente essa espontaneidade, mas não é um grande jogador. Só será um grande jogador quando conseguir integrar-se melhor na manobra coletiva. E ele estava a tentar fazê-lo este ano, com alguma vontade.
«Miguel pode ter carreira brilhante»
R – Está de acordo que o regresso de Rochemback não resultou?
PB – A vinda dele traduziu-se em dois momentos. A época em que regressou, durante a qual teve um rendimento positivo, ainda que sem ser extraordinário. Ficou, porém, nitidamente marcada pela lesão em Matosinhos, que lhe tirou os últimos 7 jogos do campeonato e roubou a continuidade que podia ter num momento em que estava bem. Ainda assim, fez uma época positiva. Era um jogador que trabalhava bem, que colocava profissionalismo no treino. Esta temporada, em função de sentir que não ia ser primeira opção, optou por chegar a acordo com o clube e sair.
R – O regresso acontece na perspetiva de Miguel Veloso estar a ser valorizado e poder sair…
PB – A vinda do Rochemback teve a ver com o critério do que nós pretendíamos em termos de identidade com o clube, competitividade para o plantel e maturidade. Era um jogador que já conhecia o clube, que tinha características importantes, como capacidade e personalidade para ter a bola.
R – Mas Veloso acabou por ser determinante na saída de Roca.
PB – Sim, esta época sim, porque a possibilidade da venda do Miguel era uma situação que estava em cima da mesa. Não houve nada de concreto, mas era equacionado. Havia outras hipóteses. Por exemplo, o Roca ficar e aí teríamos de encontrar uma solução para o Adrien jogar. Mas com o arranque do Miguel, sendo ele que começou a jogar, invertendo a situação da época anterior, junto com as dificuldades que Rochemback revelou na fase inicial da temporada, também por algum excesso de peso com que apareceu, levou a que ponderasse a saída. Nós aceitámos porque ficávamos com o Miguel e o Adrien. Como opção ficámos com um jogador mais jovem, com características diferentes mas com vontade de jogar.
R – Miguel Veloso foi um dos que chorou baba e ranho com a sua saída, como descreveu Bettencourt?
PB – As expressões têm de ser entendidas em determinados contextos. O Miguel teve ao longo deste percurso um rendimento positivo. E só não foi mais positivo porque as oscilações foram muito mais em termos emocionais e mentais do que propriamente em termos de rendimento. Ou seja, foram as oscilações emocionais que lhe provocaram uma queda de rendimento. Só por isso não teve um rendimento excecional ao longo deste trajeto. As razões que levaram a que ele tivesse essas quebras em termos emocionais são mais abrangentes.
R – Mas sentiu a sua saída?
PB – Em relação a essa questão, é verdade que era um jogadores que, num momento difícil, porque foi um momento difícil para todos ou para quase todos – pela emotividade, pela relação de muitos anos, porque era um jogador que estava comigo no Sporting desde 2006/07, mais os juniores -, foi um jogador que sentiu de uma maneira triste a minha saída. Assim como muitos outros. O Miguel é um jogador que tem um talento e uma capacidade técnica enormes e que se não tiver oscilações, poderá ter uma carreira brilhante pela frente.
R – Para além do Stojkovic mais alguém ficou satisfeito com a saída?
PB – Não sei se o Stojkovic ficou satisfeito ou não e sinceramente não me interessa. Acho é que houve um grupo de jogadores que eu tive que abandonar, com quem criei afinidades diferentes, mas aos quais respeitei, fui solidário e sério e a quem, dentro da minha competência, tentei ajudar. Se o Stojkovic ficou satisfeito ou insatisfeito, é-me completamente indiferente. Se me perguntarem a mim se a partir de determinado momento ficaria mais satisfeito se não o tivesse no plantel do Sporting responderia: claramente.